TRABALHO DE PROJECTO
Algumas noções sobre trabalho de projecto
A escola e a educação preenchem muitas finalidades da sociedade. A
escolaridade é um meio através do qual a sociedade forma a geração mais nova, para lhe
dar os conhecimentos necessários, as atitudes e as capacidades para virem a ocupar um
lugar na sociedade.
Mas o sistema escolar também tem a função da máquina seleccionadora
que legitima as diferenças entre as pessoas e controla a estabilidade da sociedade
(Althusser, 1974).
Durante os últimos anos temo-nos tornado cada vez mais conscientes da
grande quantidade de finalidades que a escola serve. Ao apresentar um curriculum aos
jovens nós desencadeamos um processo que irá afectá-los de muitos modos. Um curriculum
não é de modo nenhum organizado ao acaso, além disso não é apresentado ao acaso. O
modo como a escola funciona reflecte toda a superestrutura da sociedade. Os professores
são geralmente oriundos de certas classes sociais definidas, que de muitos modos afectam
o código utilizado na apresentação do conteúdo às crianças. Por código nós
queremos significar todo o cenário social - a linguagem, as atitudes e o contexto. A
escola reflecte, deste modo, toda a hierarquia da sociedade. As crianças começam muito
cedo a perceber o seu próprio papel na vida futura através dos resultados obtidos na
escola. A escola - não sendo criadora de ideias e objectivos, mas sobretudo transmissora
de objectivos e intenções da sociedade - tem assim um papel importante em toda a
reprodução da sociedade (Althusser).
A mudança radical verificada em Portugal em 1974 chamou a atenção sobre
o papel vital da escola como principal agente de mudança na sociedade. Duma instituição
cujo principal objectivo era garantir a um pequeno grupo de pessoas a missão de continuar
a direcção do pais e das colónias, a nova instituição passou a ter um lugar central
na discussão de como estabilizar a nova sociedade e a democracia.
Durante a era de Salazar a escola foi elitista, influenciada pelos ideais
clássicos das universidades e tendo essencialmente um papel de legitimadora da classe
dirigente.
Desde 1835, quando a lei sobre o sistema de educação nacional foi
introduzia em Portugal e mesmo ainda hoje só uma pequena proporção das crianças
continua a sua escolaridade.
A escola, sendo um dos principais instrumentos do estado para criar
igualdade de oportunidades tem evidentemente que ter em conta muitos aspectos. Criar novos
meios de instrução, reformar os planos curriculares ou reformar a formação de
professores será só "fogo de vista" enquanto a escola conservar a sua
orientação selectiva actual. Contudo, as mudanças não podem acontecer ao mesmo tempo
em todos os campos e mudar um sistema educacional é um processo demorado Evidentemente
devem ser tomadas medidas em muitos campos, ao mesmo tempo, para que a escola se possa
aproximar dos objectivos que guiam a sua existência
A vida na sala de aula é um reflexo da vida da sociedade. A sala de aula
manifesta muitos dos fenómenos sociais que estão ligados à vida da comunidade. Entre os
alunos encontramos diferenças de aptidões, concorrências, relações positivas e
negativas), diferenças de "background", diferenças de linguagem e compreensão
assim como códigos sociais diferentes. No ensino tradicional, todos estes fenómenos
existem também, mas ou não são considerados pelo professor como elementos incómodos ou
não são mesmo reconhecidos. Como o papel da escola está a mudar e novas tarefas têm
que ser levadas a cabo - como por exemplo, ensinar o conceito de democracia, estes
fenómenos têm que ser tomados em conta no processo do ensino. Considerando que o ensino
é um processo social que tem muito mais a fazer do que só ensinar este ou aquele
assunto, torna-se necessário analisar o impacto de todos esses fenómenos no processo da
aprendizagem. Como professores toma-se importante todos estes processos para criarmos
condições tão boas quanto possíveis para todas as crianças.
A existência de novos objectivos para a escola levou os professores de
todo o mundo, por vezes em experiências selvagens, a encontrar saídas para si próprios
como profissionais e para a escola tradicional: democratizá-la, dar-lhe novos conteúdos
e promover o desenvolvimento individual.
Tentaram-se novas correntes pedagógicas que foram por vezes, admiradas, e
outras vezes, rejeitadas ou consideradas impraticáveis, em muitos casos, infelizmente, o
campo da educação foi considerado sem limites ou fronteiras, Partindo do idealismo, o
produto final tem sido muitas vezes o pessimismo.
Outros educadores têm tentado, de um modo mais lento e sistemático,
identificar as fronteiras e limites do processo educacional e a partir deste conhecimento
procuraram localizar os pontos em que a mudança é viável.
Considerando a escola como um sistema sociológico, não pode fazer-se uma
mudança ou um ensino com sucesso se isso depende exclusivamente de um só professor e da
sua energia. Mudar deve ser, na sua natureza interna, algo de estável no tempo e não
dependente de iniciativas de pessoas isoladas. A escola é uma das instituições mais
estáveis da sociedade. O que se passa dentro da escola é gerido por regras e ideias
muito especificas e tradições emanadas de grupos muito especiais da sociedade. Tanto a
organização interior como exterior da escola são semelhantes em 4uase todos os países.
A divisão entre as disciplinas, a duração das lições, o conteúdo dos assuntos
mostram grandes semelhanças em toda a parte. Mesmo o modo de ensinar - a transmissão de
conhecimentos - é organizado de maneira quase idêntica.
Mudar o ensino requer evidentemente esforços da parte das pessoas
envolvidas. No entanto, se nós queremos que a escola tenha um papel activo na formação
de crianças, e não seja um sistema legitimador para aqueles que já tem uma posição
garantida na sociedade. tomando-se evidente, necessário o inevitável abandonar as
tradicionais formas de ensino.
Como professores temos que nos colocar fora da escola e tentar, com olhos
de criança, o que se passa lá dentro e pôr em causa tudo o que virmos. Temos que ver
realmente o que se passa e não só aceitar aquilo que as pessoas dizem que se passa.
Temos que descodificar todo o sistema de instrução e rever os fundamentos mais básicos
sobre educação e aprendizagem.
Ao analisar os "novos" métodos de ensino pode-se imediatamente
verificar que não há nenhum que possa resolver sozinho o dilema da escola, e nenhuma
fórmula que possa ser adoptada e que nos afasta de efeitos indesejáveis de
institucionalização ensino/aprendizagem.
O "Background" do Trabalho Projecto
Em discussões sobre a maneira como o processo de ensino deve ser
organizado a maioria dos postulados anteriores têm sido postos em causa. Especialmente
três aspectos do ensino tradicional têm sido encarados como negativos:
Isto conduziu à criação de um grande número de conceitos tais como:
estudos de projecto, guia de participantes, orientação de projectos e orientação de
problemas. Este grande número de conceitos tem sido muito confluso. No seu seguimento
têm sido feitas muitas tentativas para seleccionar os conceitos e fornecer algumas
definições e alguns requisitos daquilo a que vai chamar trabalho de projecto.
O que é Trabalho de Projecto
Numa obra dinamarquesa os seus autores definem-no do seguinte modo:
"Queremos definir Trabalho de Projecto como uma forma de educação,
onde os alunos - em colaboração com os professores e outras pessoas - exploram e tratam
um problema em relação directa com a realidade social em que o problema surge. Isto
significa, que o trabalho dá gradualmente uma perspectiva mais ampla e uma compreensão
mais profunda, que o problema é abordado de um número de ângulos diferentes rompendo
com os limites tradicionais entre as disciplinas e que a escolha de teorias, métodos e
instrumentos é gerida pelo próprio problema. A função do professor não é só a de
transmitir conhecimentos, é mais do que isso: funcionar como um rastilho, um inspirador
que defina os limites e a orientação. O trabalho termina num produto concreto que pode
ser um relatório oral, um relatório escrito ou ser expresso por outros meios ou
acções.
A definição dá lugar a muitas variações: de um só dia a muitos anos,
de alguns participantes a toda uma escola, do pré-primário à educação de adultos, de
alunos dependentes a alunos muito independentes - mas leva a um trabalho guiado por
objectivos claros partindo de um problema concreto, rejeitando assim a tendência que tem
aparecido nos últimos anos para abranger todos os assuntos, ainda que subsidiário em que
os alunos trabalham."
(Berthelsenet aí. 1977p. 141)
A definição mostra que o trabalho projecto tem poucas exigências
especificas quer sobre o conteúdo, quer sobre o professor e o aluno: os objectivos para
os estudos devem ser problemas - e não conteúdos escolhidos previamente pelo professor
ou por qualquer outra pessoa de acordo com definições de conhecimento feitas
anteriormente. Além disso, a maneira de trabalhar dever ser de exploração, donde a sua
semelhança com um trabalho de pesquisa.
A orientação do problema é definida por Illeris do seguinte modo:
"O ponto crucial na Educação centrada em problemas é que não se
parte de assuntos ou disciplinas já estabelecidas, cuja origem está bastante recuada, no
tempo e resultante de condições há muito desaparecidas. Em vez disso temos que partir
de problemas que ocorrem aqui e agora. Para tratar e compreender estes problemas o
conhecimento dos diferentes assuntos, métodos e teorias têm que estar integrados num
grau exigido pelo problema em questão."
(Illeris, 1976 p.71)
Estas definições levam-nos a alguns princípios básicos que dizem
respeito a este tipo de trabalho.
Primeiro: o trabalho feito deve ter um significado para o aluno, e
isto implica que o aluno seja capaz de ver o significado de todas as actividades em que
está empenhado. Mas o trabalho deve ser escolhido de modo a que tenha um significado para
os outros - de modo a que os outros alunos possam aprender daí alguma coisa.
Segundo: os problemas escolhidos para estudo devem estar
verdadeiramente ligados à realidade do aluno e ser passíveis de serem tratados por ele
tendo em conta o tempo de que dispõe, a sua capacidade, recursos de informação a que
possa ter acesso (bibliografia, inquéritos, entrevistas).
Terceiro: os alunos devem ter uma grande influência na escolha dos
problemas. Os problemas escolhidos pelo professor e impostos aos alunos nunca serão base
para um trabalho bem sucedido e nunca conduzirão a resultados desejáveis.
Quarto: a integração da teoria com a prática é um a necessidade
de importância vital. Como o significado de todo o ensino é um aumento dos limites e
fronteiras de referência, um integração entre estes dois aspectos ajudarão o aluno a
ver novos campos de exploração.
Tomando isto em conta, o trabalho de projecto pode dar aos estudantes um
treino em:
(Adaptado de Berthtelsen et aí. op. sit.).
As capacidades acima mencionadas são certamente aquelas que nós
desejamos sejam adquiridas pela geração futura.
Infelizmente, não há "métodos" que dêem soluções
"empacotadas". Obter uma coisa pode muitas vezes significar ficar com déficites
em outros campos.
Se o trabalho de projecto não for realizado de um modo correcto, pode
criar uma situação em que a liberdade relativa, em vez de promover o ensino, se torna um
obstáculo, uma situação em que os fortes vencem, uma situação em que os problemas
dentro do grupo se tornam mais importantes do que o problema em estudo.
Isto requer assim uma grande perícia por parte do professor para detectar
tendências de mau funcionamento, ser sensível aos processos dentro do grupo, e ter
capacidade para ajudar o grupo a ultrapassar problemas relacionados com cooperação.
E também importante tomar consciência de que o mesmo trabalho de
projecto tem as suas limitações e não pode ser usado em todos os contextos.
Mas usado com inteligência e cautela, pode ajudar os alunos a adquirir
uma melhor compreensão do mundo que o rodeia e da sociedade.
TRABALHO DE PROJECTO
Escola Superior de Educação - Estocolmo Comissão Instaladora de um curso
para formação de formadores
(CICFF - OEP)

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